ENSINAR: UMA TAREFA PASTORAL

1/06/2015 0 Comments

A missão dada pelo Senhor Jesus à sua igreja foi bem clara e precisa: fazer discípulos batizando e ensinando. Isto nos mostra a natureza da missão. Na caminhada a igreja trabalha para levar pessoas a um compromisso com o Senhor da Igreja que se expressa pelo batismo e tem continuidade através do ensino. Este processo de ensino pode ocorrer de maneira formal e sistemática, mas também informal através dos relacionamentos diários onde os novos convertidos percebam e aprendam vendo na prática as ações resultantes de um compromisso com o Senhor Jesus.

O Espírito Santo capacita pessoas dentro da igreja para uma função especifica de ensino, ao conceder-lhes esse dom. Dentre tantos dons que o Espírito concede à igreja está o dom do ensino com o objetivo de conduzir os crentes no caminho da obediência. Embora a responsabilidade de ensinar tanto pela vida como pelas ações é de toda a igreja, algumas pessoas recebem de modo particular essa tarefa, como nos ensina o apóstolo Paulo em Efésios 4.11-12 “E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo” (grifo nosso)

PASTORES: TAREFA DE ENSINAR

Calvino comentando o texto de Efésios diz que ensinar é, sem dúvida, uma responsabilidade de todos os pastores, todavia para preservar a boa doutrina requer uma habilidade para interpretar a Escritura e uma pessoa pode ser um mestre, sem, contudo estar qualificado para pregar. Por isso é preciso reconhecer que há pessoas na igreja que embora não tenham sido ordenadas para o ministério pastoral, tenham e exerçam com muita propriedade o dom do ensino.

A ênfase paulina sobre a responsabilidade pastoral de ensino é evidenciada por outros textos: “Ordena e ensina estas coisas” I Tm 4.11; “Ensina e recomenda estas coisas” I Tm 6.3; “o qual nós anunciamos, advertindo a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo;” Cl 1.28; “É necessário, portanto, que o bispo seja apto para ensinar” I Tm 3.2; “Até à minha chegada, aplica-te à leitura, à exortação, ao ensino” I Tm 4.13; “o que da minha parte ouviste através de muitas testemunhas ensina a homens fiéis” II Tm 2.2 e assim por diante.

O trabalho pastoral não se restringe ao púlpito – que não deixa de ser também um lugar de ensino – mas estende-se a outras atividades, principalmente o foco em relacionamentos pessoais que assumem um caráter intencional e sistemático com objetivo de conduzir pessoas à maturidade. Há ensinamentos que são transmitidos pelo exemplo, pela vida, pelas posturas e não necessariamente por aquilo que falamos. Somente um ambiente de confiança e companheirismo permite este tipo de ensino. Alguém disse com muita propriedade que as pessoas não se importam com quanto você sabe até que elas percebam o quanto você se importa com elas. Relacionamentos confiáveis não são construídos da noite para o dia.

Uma finalidade bem específica dos dons listados em Efésios 4.11-12 é a preparação ou aperfeiçoamento dos crentes para os seus ministérios. Eugene Peterson na sua bela paráfrase “A Mensagem” traduz assim: “para treinar os seguidores, para que haja um trabalho de qualidade no corpo de Cristo, a igreja.” Isto nos mostra não apenas a natureza do trabalho pastoral, mas também o propósito e o alvo a ser alcançado. O termo aperfeiçoar significa também equipar, reparar, colocar em ordem algo que estava quebrado, distorcido. Interessante observar que esse mesmo verbo aperfeiçoar/consertar é usado no texto de Mc 1.19 quando os discípulos estavam consertando as redes preparando-as para o trabalho da pesca. Há outras referências mencionando o aperfeiçoamento do caráter cristão como I Co 1.10.

DISTORÇÕES NO MINISTÉRIO PASTORAL

Este propósito do trabalho pastoral tem sido facilmente esquecido ou negligenciado por uma série de fatores: desinformação do que seja o trabalho pastoral na sua essência; expectativas errôneas por parte da igreja; subordinação da agenda pastoral à injunções políticas; formação pastoral defectiva; modelos pastorais distorcidos e outros fatores.
Quando o pastor se preocupa em atender tão somente as demandas e reage apenas às circunstâncias ao invés de organizar uma agenda proativa, acaba “dançando conforme a música” e não cria um ambiente e circunstâncias. Ele fica à mercê dos acontecimentos, não assume o controle no sentido de apontar um rumo e sinalizar o direcionamento da igreja. A agenda pastoral tem que ser definida pela Palavra, não pela expectativa de pessoas. Equivocadamente pensa-se que servir as pessoas em seus interesses e expectativas é o mesmo que servir a Cristo. 
Espera-se, geralmente, que o pastor seja um empregado faz-tudo na igreja, uma espécie de pastor “bombril”. Por outro lado os pastores em busca de autorealização – como em qualquer outra atividade humana – acabam enveredando por atividades cujos resultados sejam mais concretos, palpáveis. Temos encontrado ao longo da caminhada pastores que se orgulham das realizações materiais tais como construção de templos, salas, reformas, aquisições de terrenos, etc. Tudo isto pode ser muito bom, instalações adequadas podem ser úteis e importantes para a vida da igreja, todavia isto não é o centro, nem pode ser a ocupação central do ministério pastoral. Outras pessoas podem e devem fazer isso sem nenhum prejuízo ao trabalho pastoral. O centro do ministério pastoral é a construção de vidas pelo ensino da Palavra.

A tarefa pastoral requer não apenas o dom do ensino, mas a preparação adequada, conforme nos lembra Paulo “o que ensina, esmere-se no fazê-lo” (Rm 12.7). Além disso, a maturidade é necessária. Não se concebe um líder imaturo conduzindo crentes à maturidade. Uma caixa d’água não impulsiona água além da sua própria altura. Muitos problemas na relação pastor-igreja devem-se à imaturidade. A formação teológica de qualidade é importante, mas infelizmente não pode ser considerada como o único requisito. Nossos concílios precisam atentar mais seriamente para esse aspecto.

COMO ENSINAR

O pastor ensina principalmente pelo exemplo. Como discípulo de Cristo ele leva pessoas ao compromisso com Cristo colocando em prática o que Jesus nos ensinou. Jesus pregou para multidões, mas ele investiu tempo e atenção ao grupo dos doze e de modo particular em três discípulos: Pedro, Tiago e João. Jesus adotou um método de ensino baseado em etapas que poderia ser exposto assim: ensinar o que fazer; explicar o porquê; mostrar como fazer; fazer juntos; permitir que eles fizessem; enviá-los a praticar o que tinham aprendido.

Esta metodologia de Jesus demanda tempo, convicção e compromisso. Um dos maiores inimigos do trabalho pastoral hoje tem sido o imediatismo e a impaciência. Em uma cultura que valoriza a velocidade, a celeridade, a paciência de caminhar juntos, aprender juntos, crescer juntos, sonhar juntos, semear e aguardar juntos os resultados que Deus concederá, não é uma virtude valorizada. Como bem disse Eugene Peterson. "Discipulado é uma tarefa que toma tempo e não pode ser apressada, mas também é um trabalho urgente que não pode ser adiado”. Retornando ao texto de Efésios 4.11-12, ali somos lembrados que o alvo do ensino é a maturidade, é conduzir pessoas à medida da estatura de Cristo. Paulo dirigindo-se aos Gálatas dizia sofrer dores de parto até Cristo ser formado em vós (Gl 4.19). Esta é uma tarefa enorme e que pode durar a vida inteira. Muitos, entretanto, ficam pelo meio do caminho cansados e desanimados, pulando de igreja em igreja e deixando esta tarefa inconclusa. Grande parte das dificuldades que enfrentamos com lideranças são reflexos da falta de ensino, de discipulado, de acompanhamento.

Esta é uma tarefa pastoral urgente e inadiável. Todavia podemos nos perguntar a exemplo de Paulo: “Quem é suficiente para estas coisas? “...pelo contrário, a nossa suficiência vem de Deus (II Co 2.16; 3.5). Que o Senhor da Igreja nos capacite para tão grande tarefa!

Rev. Áureo R. Oliveira

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