ENSINAR: UMA TAREFA PASTORAL
A
missão dada pelo Senhor Jesus à sua igreja foi bem clara e precisa: fazer
discípulos batizando e ensinando. Isto nos mostra a natureza da missão. Na
caminhada a igreja trabalha para levar pessoas a um compromisso com o Senhor da
Igreja que se expressa pelo batismo e tem continuidade através do ensino. Este
processo de ensino pode ocorrer de maneira formal e sistemática, mas também
informal através dos relacionamentos diários onde os novos convertidos percebam
e aprendam vendo na prática as ações resultantes de um compromisso com o Senhor
Jesus.
O
Espírito Santo capacita pessoas dentro da igreja para uma função especifica de
ensino, ao conceder-lhes esse dom. Dentre tantos dons que
o Espírito concede à igreja está o dom do ensino com o objetivo de conduzir os
crentes no caminho da obediência. Embora a responsabilidade de ensinar tanto
pela vida como pelas ações é de toda a igreja, algumas pessoas recebem de modo
particular essa tarefa, como nos ensina o apóstolo Paulo em Efésios 4.11-12 “E
ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para
evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento
dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de
Cristo” (grifo nosso)
PASTORES: TAREFA DE ENSINAR
Calvino comentando o texto de Efésios diz que ensinar é, sem dúvida, uma responsabilidade de todos os pastores, todavia para preservar a boa doutrina requer uma habilidade para interpretar a Escritura e uma pessoa pode ser um mestre, sem, contudo estar qualificado para pregar. Por isso é preciso reconhecer que há pessoas na igreja que embora não tenham sido ordenadas para o ministério pastoral, tenham e exerçam com muita propriedade o dom do ensino.
A
ênfase paulina sobre a responsabilidade pastoral de ensino é evidenciada por
outros textos: “Ordena e ensina estas coisas” I Tm 4.11;
“Ensina e recomenda estas coisas” I Tm 6.3; “o qual nós anunciamos, advertindo
a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que
apresentemos todo homem perfeito em Cristo;” Cl 1.28; “É necessário, portanto,
que o bispo seja apto para ensinar” I Tm 3.2; “Até à minha chegada, aplica-te à
leitura, à exortação, ao ensino” I Tm 4.13; “o que da minha parte ouviste
através de muitas testemunhas ensina a homens fiéis” II Tm 2.2 e assim por
diante.
O
trabalho pastoral não se restringe ao púlpito – que não deixa de ser
também um lugar de ensino – mas estende-se a outras atividades, principalmente
o foco em relacionamentos pessoais que assumem um caráter intencional e
sistemático com objetivo de conduzir pessoas à maturidade. Há ensinamentos que
são transmitidos pelo exemplo, pela vida, pelas posturas e não necessariamente
por aquilo que falamos. Somente um ambiente de confiança e companheirismo
permite este tipo de ensino. Alguém disse com muita propriedade que as pessoas
não se importam com quanto você sabe até que elas percebam o quanto você se
importa com elas. Relacionamentos confiáveis não são construídos da noite para
o dia.
Uma
finalidade bem específica dos dons listados em Efésios 4.11-12 é a preparação
ou aperfeiçoamento dos crentes para os seus ministérios.
Eugene Peterson na sua bela paráfrase “A Mensagem” traduz assim: “para treinar
os seguidores, para que haja um trabalho de qualidade no corpo de Cristo, a
igreja.” Isto nos mostra não apenas a natureza do trabalho pastoral, mas também
o propósito e o alvo a ser alcançado. O termo aperfeiçoar significa também
equipar, reparar, colocar em ordem algo que estava quebrado, distorcido.
Interessante observar que esse mesmo verbo aperfeiçoar/consertar é usado no
texto de Mc 1.19 quando os discípulos estavam consertando as redes
preparando-as para o trabalho da pesca. Há outras referências mencionando o
aperfeiçoamento do caráter cristão como I Co 1.10.
DISTORÇÕES NO MINISTÉRIO PASTORAL
Este propósito do trabalho pastoral tem sido facilmente esquecido ou negligenciado por uma série de fatores: desinformação do que seja o trabalho pastoral na sua essência; expectativas errôneas por parte da igreja; subordinação da agenda pastoral à injunções políticas; formação pastoral defectiva; modelos pastorais distorcidos e outros fatores.
Quando o pastor se preocupa em atender tão somente
as demandas e reage apenas às circunstâncias ao invés de organizar uma agenda
proativa, acaba “dançando conforme a música” e não cria um ambiente e
circunstâncias. Ele fica à mercê dos acontecimentos, não assume o controle no
sentido de apontar um rumo e sinalizar o direcionamento da igreja. A agenda
pastoral tem que ser definida pela Palavra, não pela expectativa de pessoas.
Equivocadamente pensa-se que servir as pessoas em seus interesses e
expectativas é o mesmo que servir a Cristo.
Espera-se, geralmente, que o pastor seja um empregado faz-tudo na
igreja, uma espécie de pastor “bombril”. Por outro lado os pastores em
busca de autorealização – como em qualquer outra atividade humana – acabam
enveredando por atividades cujos resultados sejam mais concretos, palpáveis.
Temos encontrado ao longo da caminhada pastores que se orgulham das realizações
materiais tais como construção de templos, salas, reformas, aquisições de terrenos,
etc. Tudo isto pode ser muito bom, instalações adequadas podem ser úteis e
importantes para a vida da igreja, todavia isto não é o centro, nem pode ser a
ocupação central do ministério pastoral. Outras pessoas podem e devem fazer
isso sem nenhum prejuízo ao trabalho pastoral. O centro do ministério pastoral
é a construção de vidas pelo ensino da Palavra.
A
tarefa pastoral requer não apenas o dom do ensino, mas a preparação adequada,
conforme nos lembra Paulo “o que ensina, esmere-se no fazê-lo” (Rm
12.7). Além disso, a maturidade é necessária. Não se concebe um líder imaturo
conduzindo crentes à maturidade. Uma caixa d’água não impulsiona água além da
sua própria altura. Muitos problemas na relação pastor-igreja devem-se à
imaturidade. A formação teológica de qualidade é importante, mas infelizmente
não pode ser considerada como o único requisito. Nossos concílios precisam
atentar mais seriamente para esse aspecto.
COMO ENSINAR
O pastor ensina principalmente pelo exemplo. Como discípulo de Cristo ele leva pessoas ao compromisso com Cristo colocando em prática o que Jesus nos ensinou. Jesus pregou para multidões, mas ele investiu tempo e atenção ao grupo dos doze e de modo particular em três discípulos: Pedro, Tiago e João. Jesus adotou um método de ensino baseado em etapas que poderia ser exposto assim: ensinar o que fazer; explicar o porquê; mostrar como fazer; fazer juntos; permitir que eles fizessem; enviá-los a praticar o que tinham aprendido.
Esta
metodologia de Jesus demanda tempo, convicção e compromisso. Um
dos maiores inimigos do trabalho pastoral hoje tem sido o imediatismo e a
impaciência. Em uma cultura que valoriza a velocidade, a celeridade, a
paciência de caminhar juntos, aprender juntos, crescer juntos, sonhar juntos,
semear e aguardar juntos os resultados que Deus concederá, não é uma virtude
valorizada. Como bem disse Eugene Peterson. "Discipulado é uma tarefa que
toma tempo e não pode ser apressada, mas também é um trabalho urgente que não
pode ser adiado”. Retornando ao texto de Efésios 4.11-12, ali somos lembrados
que o alvo do ensino é a maturidade, é conduzir pessoas à medida da estatura de
Cristo. Paulo dirigindo-se aos Gálatas dizia sofrer dores de parto até Cristo
ser formado em vós (Gl 4.19). Esta é uma tarefa enorme e que pode durar a vida
inteira. Muitos, entretanto, ficam pelo meio do caminho cansados e desanimados,
pulando de igreja em igreja e deixando esta tarefa inconclusa. Grande parte das
dificuldades que enfrentamos com lideranças são reflexos da falta de ensino, de
discipulado, de acompanhamento.
Esta é
uma tarefa pastoral urgente e inadiável. Todavia podemos nos
perguntar a exemplo de Paulo: “Quem é suficiente para estas coisas? “...pelo
contrário, a nossa suficiência vem de Deus (II Co 2.16; 3.5). Que o Senhor da
Igreja nos capacite para tão grande tarefa!
Rev. Áureo R. Oliveira
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